Em março, comemoramos o dia da mulher e frequentemente vemos muitas flores e homenagens que costumam aparecer no meio cervejeiro e em todos os meios. Porém, será que, por trás dessas homenagens, existe uma real reflexão sobre o que representa a data de 8 de março? E você sabe o que aconteceu nessa data?
No mês de março, além do dia da mulher, não por coincidência, comemoramos o aniversário da cerveja Sapatista. Com muito orgulho e resistência, iremos celebrar dois anos da cerveja revolucionária e hoje viemos aqui contar alguns motivos de termos escolhido essa data para nossa fundação.
É claro que é importante homenagearmos as mulheres que admiramos e que contribuem em nossa sociedade nas diversas áreas. Mas não podemos esquecer que essas contribuições são diárias e que o ideal seria recebermos o carinho e respeito o ano todo.
Enquanto brotam as flores e os convites para participarmos de eventos falando sobre mulher e cerveja, principalmente no mês de março, o ano todo outras milhares de mulheres sofrem diversas formas de abuso e violência doméstica em todo o Brasil.
Durante a pandemia, os casos de feminicídio cresceram em 22% em 12 estados brasileiros. Além disso, muitas mulheres continuam sofrendo agressões em suas casas, embora não procurem com tanta frequência as delegacias e seguem caladas.
Se enxergamos o 8 de março como um momento de celebrar a conquista de diversos dos nossos direitos, é importante também compreender essa data como a mais importante do ano, um dia de luta e de combate contra as desigualdades de gênero e a violência contra as mulheres.
E, então, a partir daí, precisamos conhecer as origens históricas e encontrar as vozes das mulheres que vieram antes de nós, para que seus discursos, revigorados pelas novas pautas das mulheres desse século, ecoem também pelas próximas gerações. Por que, afinal, assim como os processos biológicos que guiam nossos corpos, a história que nos guia é cíclica e precisamos estar preparadas para continuar lutando.
As origens históricas do dia da mulher
Para ganharmos agora flores no dia da mulher, no dia 25 de março de 1911, foram mortas 129 mulheres.
Cerca de 600 operários e operárias estavam trabalhando em uma fábrica de roupas em Nova York, nos Estados Unidos, em pleno sábado à tarde, quando iniciou um incêndio no prédio. Os donos da fábrica da Triangle Shirtwaist Company já possuíam histórico de incêndios suspeitos, provavelmente para ganhar o dinheiro do seguro. Porém, apesar dos diversos indícios de que o incêndio foi criminoso, a empresa foi absolvida pela Justiça. O caso e o descaso com as trabalhadoras e trabalhadores jamais foram esquecidos.
As péssimas condições de trabalho foram então expostas a partir do incêndio. Na fábrica, a principal mão de obra era de mulheres e meninas imigrantes – russas, italianas, alemãs e húngaras. Havia até mesmo crianças de 12 anos de idade. Movidas pelo pânico, várias das vítimas tentaram escapar do incêndio, mas as saídas estavam trancadas por fora. A solução desesperadora e fatal para 58 pessoas foi pular da janela. Esse incêndio é tido como o mais mortal acidente de trabalho.
Embora a origem exata do Dia Internacional da Mulher seja controversa, a morte das trabalhadoras da fábrica é sempre lembrada como um dos eventos que o motivaram. Sendo que dois anos antes do fatídico episódio, a fábrica havia sido um dos principais alvos da greve dos trabalhadores da indústria do vestuário, liderada por mulheres do Sindicato de Trabalhadoras dos EUA. O movimento pedia melhores salários, jornada de 10 horas por dia e igualdade entre homens e mulheres.
Algumas histórias indicam que os eventos que levaram à criação dessa data ainda são anteriores aos acontecimentos que relatamos. Desde o final do século 19, organizações femininas oriundas de movimentos operários já protestavam em diversos países da Europa e nos Estados Unidos por melhores condições de trabalho.
O primeiro dia da mulher
O primeiro Dia Nacional da Mulher foi celebrado em 1907, nos Estados Unidos, quando cerca de 1500 mulheres aderiram a uma manifestação em prol da igualdade econômica e política no país. Mas essa manifestação ainda não era em 8 de março, foi realizada em maio. No ano seguinte, o Partido Socialista dos EUA oficializou a data como sendo 28 de fevereiro, com um protesto que reuniu mais de 3 mil pessoas no centro de Nova York e culminou em 1909, em uma longa greve que fechou quase 500 fábricas americanas que atuavam na indústria têxtil.
Outros caminhos diferentes, mas semelhantes, indicam que a data teve origem a partir de uma manifestação organizada por tecelãs e costureiras de Petrogrado, durante a greve iniciada no dia 8 de março na Rússia. Esse movimento foi o estopim da primeira fase da Revolução Russa. Nessa data, aproximadamente 90 mil mulheres operárias manifestaram-se contra o Czar Nicolau II e teriam saído corajosamente às ruas reivindicando “pão para nossos filhos” e “retorno de nossos maridos das trincheiras”, em um protesto conhecido como “Pão e Paz”. Essa data teria sido consagrada como o marco do Dia Internacional da Mulher, embora tenha sido oficializada somente em 1921.
Dia da mulher: por que dia 8 de março?
Então por que, se a criação do dia da mulher aparentemente foi inspirada nessas histórias que contamos, comemoramos agora no dia 8 de março?
A data de 23 de fevereiro de 1917, no antigo calendário russo, parece atualmente representar o dia 8 de março. Em 1910, durante a II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas na Dinamarca, foi aprovada uma resolução para a criação de uma data anual para a celebração dos direitos da mulher por representantes de 17 países.
Porém, foi somente em 1945 que a Organização das Nações Unidas assinou o primeiro acordo internacional que afirmava princípios de igualdade entre homens e mulheres. Assim, nos anos de 1960, o movimento feminista ganhou corpo. Em 1975, comemorou-se oficialmente o Ano Internacional da Mulher e, em 1977, o 8M foi reconhecido oficialmente pelas Nações Unidas como o Dia Internacional da Mulher.
Dia da mulher: conheça algumas das principais conquistas das mulheres
Como visto anteriormente no texto que publicamos aqui no blog falando das mulheres cervejeiras, a luta para vivermos em uma sociedade machista é antiga.
Aqui no Brasil, até por volta dos anos de 1800, as mulheres eram consideradas propriedades dos seus pais, maridos, irmãos, ou qualquer chefe de família e não tinham direito de acesso à educação. Foi somente durante o Império que o direito ao acesso à educação foi conquistado, e Nísia Floresta fundou a primeira escola para meninas no Brasil.
Também, por volta de 1900, com a luta das mulheres que trabalhavam em indústrias, principalmente na área têxtil, iniciou-se a discussão sobre regularização do trabalho feminino. No artigo “A história da conquista das mulheres”, vimos que a partir da revolução industrial e do êxodo rural, a mulher conquistou finalmente o direito de trabalhadora assalariada. Porém, semelhante aos dias de hoje, seu salário era muito inferior ao dos homens. E, além disso, sempre teve que fazer dupla jornada, o trabalho mal valorizado fora de casa somado ao não valorizado trabalho doméstico.
Direitos da mulher
Em nosso país, as movimentações em prol dos direitos da mulher surgiram em meio aos grupos anarquistas no início do século 20, que buscavam melhores condições de trabalho e qualidade de vida. A luta feminina ganhou força com o movimento das sufragistas, nas décadas de 20 e 30. Até o ano de 1928, as mulheres não participavam das eleições no Brasil.
No ano de 1928, é autorizado o primeiro voto feminino no Brasil e também foi o ano em que foi eleita a primeira prefeita no país. Porém, ambos os atos foram anulados. Foi somente a partir da constituição de 1964 que finalmente conquistamos nosso direito ao voto e à candidatura. Dessa época para a posse da primeira presidenta do país, Dilma Rousseff, foram 47 longos anos.
Além disso, a partir da década de 60 outros temas relevantes para trazer qualidade de vida às mulheres começaram a ser discutidos por aqui, como o acesso a métodos contraceptivos, igualdade entre homens e mulheres, tópicos sobre saúde preventiva, equiparação salarial e a proteção da mulher contra a violência doméstica.
Algumas pautas feministas
A partir dos anos 70, emergiram no país organizações que passaram a incluir em suas discussões essas pautas relatadas. Em 1982, houve a criação do Conselho Estadual da Condição Feminina em São Paulo, e, em 1985, tivemos o aparecimento da primeira Delegacia Especializada da Mulher.
Em 2006, após o Estado brasileiro ser condenado por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica contra as mulheres, o governo se viu obrigado a criar um novo dispositivo legal que trouxesse maior eficácia na prevenção e punição desses casos no Brasil. Assim, nesse ano, o congresso aprovou a Lei Maria da Penha, legislação que leva o nome de uma das milhares de vítimas de agressão, que quase foi assassinada pelo marido duas vezes, mas sobreviveu e resolveu batalhar arduamente para que seu agressor fosse condenado.
Outras conquistas mais recentes das mulheres foram que, no ano de 2015, foi sancionada a lei 13.104/15 que torna qualificado o homicídio quando realizado contra mulheres em razão de gênero. Outra conquista das mulheres foi a inclusão, na Constituição Federal, do direito à licença maternidade remunerada, que hoje dá direito a 180 dias.
De qual feminismo estamos falando?
Assim, se hoje algumas mulheres que vivem aqui podem experimentar uma qualidade de vida melhor, é porque não só no Brasil, mas em outros lugares do mundo, muitas lutaram e, por vezes, morreram antes de nós. Mas, para além das lutas por equidade de gênero, é preciso atenção ao revisar as pautas levantadas pelo movimento feminista no Brasil e no mundo.
Quando partimos da concepção de que o movimento luta a favor dos direitos sociais, econômicos e políticos da mulher, precisamos compreender de qual mulher ele fala. É necessário enxergar que a maioria dessas reivindicações compreendem as mulheres brancas e de classe média. Enquanto que a mulher negra sempre trabalhou, mesmo contra sua vontade. E essa mesma mulher não era vista nem para o homem branco, nem para uma mulher branca, enquanto gênero.
Até o final do século 19 e início do século 20, as mulheres e homens negros eram vistos apenas como objetos de exploração. Então, enquanto as pautas de luta das mulheres brancas avançavam em busca da emancipação, a mulher negra ainda buscava ser aceita como sujeito.
Assim, a pauta do feminismo negro surgiu na década de 60 nos EUA e na década de 70 no Brasil, tendo como objetivo trabalhar a pauta racial associada à opressão de gênero, centralizando a discussão para as reais necessidades da mulher negra. Uma vez que a mulher negra era duplamente silenciada nos espaços aos quais pertencia.
Como já vimos aqui no blog, um bom exemplo das conquistas das mulheres que não contemplaram as mulheres negras foi a atuação das sufragistas e a luta pela emancipação financeira na primeira onda do movimento feminista. Em sua grande maioria, essas reivindicações eram lideradas por mulheres brancas, as quais não pautavam as especificidades das mulheres negras.
Dia da mulher e Sapatista: a revolução de uma cerveja feita por mulher!
Apesar de fazer cerveja em casa há muitos anos, foi somente no final de 2018 que a Roberta Pierry, nossa “Betinha”, resolveu transformar a paixão em profissão. Se hoje a história da Beta deu origem a uma empresa que se posiciona nas redes sociais e no mundo na primeira pessoa do plural, é porque ela não anda sozinha, e a cerveja Sapatista não representa somente sua luta individual.
Após muito estudo e o retorno positivo das amigas, Roberta sentiu-se segura dos resultados apresentados por ela mesma, oficializando, no dia 8 de março de 2019, a concepção da Sapatista Comércio de Cervejas Artesanal LTDA. Uma cerveja que se lançou ao mundo como revolucionária, feita por mulheres, surgindo da paixão por cerveja e culinária.
Revolucionária pois além de ser feita por mulher, em cada rótulo carrega a biografia de outras mulheres que foram marcantes na história mundial. Em um mercado que até então silenciava o protagonismo das mulheres, descobertas como as primeiras produtoras da bebida, e utilizava nossos corpos como ferramenta de marketing, posicionar-se como uma cerveja a favor da diversidade, com um slogan forte e potente é um grande ato político. Sapatista é cerveja feita por mulher, para o mundo todo beber.