A Escola Belga de cerveja é uma das quatro escolas cervejeiras reconhecidas no mundo e, de certa forma, podemos dizer que é a mais tradicionalista de todas. Além disso, essa escola é um explosão de tudo e é muito comum ouvirmos: “Aquelas cervejas estranhas, azedas e ácidas”, ou “As cervejas são tão fortes que não dá para beber mais de uma”.
Contudo, pode ter certeza de que ninguém vai se importar muito com isso na Bélgica, pois eles gostam de fazer seus estilos próprios e do seu jeito. Então, se você é uma dessas pessoas que não é muito fã dessa escola, provavelmente você não aprendeu a apreciar essas maravilhas, porque, sem dúvida nenhuma, essas cervejas são espetaculares!
Durante o Império Romano, na região conhecida como Gália, atualmente França e Bélgica, os habitantes da região já produziam sua própria cerveja, que já era bem diferente das cervejas mais consumidas pelos romanos.
Nesse sentido, as cervejas ainda eram produzidas domesticamente. E, com a queda do Império Romano e a ascensão da Igreja, começaram a surgir monastérios por todas as regiões. Estes monastérios foram construídos com cervejarias, que tinha como finalidade atender os próprios monges e também a população local.
Sendo assim, a Escola Belga de cerveja foi se refinando ao longo dos tempos, aprimorando técnicas e cervejas, desenvolvendo cada vez mais um perfil complexo, intensamente aromático, alcoólico e com uma explosão de aromas, sabores e sensações.
Além disso, eles também foram os primeiros a ousarem nas técnicas de fermentação, utilizando tanques abertos e incrementando, na fermentação, leveduras selvagens, a chamada fermentação espontânea. Muito diferente da Escola Alemã, onde ainda se tem a tradição da lei de pureza alemã, os belgas nunca gostaram dessa coisa de fazer cerveja apenas com água, malte, lúpulo e levedura. Sim, eles são ousados e reinventaram a arte de brassar cerveja, adicionando especiarias, frutas e toda a criatividade possível para trazer para nós essas cervejas fantásticas.
A Escola Belga de cerveja, além de ousada, é muito criteriosa e, para que uma cerveja seja considerada Belga, ela só pode ser produzida dentro dos monastérios, também chamadas de cervejas de Abadia.
Nas cervejas de Abadia, também temos algumas que fazem parte da ordem Trapista, mas não se engane, pois toda cerveja Trapista é de Abadia, mas nem toda cerveja de Abadia é Trapista. Nesse sentido, as cervejas Trapistas são aquelas que possuem designação legal, atendendo às regras de São Bento, e que podem se utilizar do selo Trapista, sendo sempre produzidas pelos monges ou sob a supervisão deles, dentro dos mosteiros religiosos.
Além disso, na Idade Média, as abadias eram centros de sabedoria e cultura. Assim, muitas vezes, eram situados em zonas rurais, onde criavam animais e produziam diversos produtos artesanais. E, em algumas regiões, onde era possível o cultivo de uva, a bebida consumida pelos monges era o vinho. Por outro lado, em outras, onde o cultivo de uva não era favorável, produzia-se a cerveja.
Nessa época, a cerveja não era produzida com lúpulo e foi só a partir dos estudos de Hildegard Von Bingen, que pertencia à Abadia Belga Beneditina de Affligem, que passou-se a utilizar o lúpulo como conservante para a cerveja.
Atualmente, existem 12 cervejarias Trapistas, e metade delas se situam na Bélgica. Nesse sentido, para serem consideradas assim, precisam seguir à risca algumas regras:
As 12 cervejarias Trapistas reconhecidas no mundo são:
Quando pensamos nas cervejas Trapistas da escola Belga de cerveja, o que primeiro vem em mente são cervejas fortes, âmbar escuro e com sedimentos na garrafa, mas isso não é bem verdade. Nesse sentido, na Bélgica, existem mais de 114 diferentes cervejas que não se enquadram nessa descrição, e as únicas características em comum entre elas é que são de alta fermentação e envasadas em garrafas.
De modo geral, o selo trapista se refere muito mais à sua origem do que uma classificação de estilos. E seus aromas, sabores e aparência são muito diferentes. Nesse sentido, ninguém, até hoje, se atreveu a produzir uma cerveja com as características únicas da Orval, e muito menos copiar o design único de suas garrafas. Já com a Tripel é diferente, primeiramente feita pelos monges de Westmalle e naquela época foi inovador e único, hoje já existem mais de 40 rótulos similares.
Nas cervejas de Abadia, no que diz respeito ao sabor, a maioria delas preenche a boca com um perfil maltado e macio com um aftertaste um pouco doce e lúpulo muito suave. Em sua maioria, são muito carbonatadas com um certo amargor no final proveniente muito mais da levedura do que do lúpulo. Em geral, as cervejas de abadia apresentam uma assinatura muito particular proveniente da levedura ou das leveduras utilizadas.
A escola Belga não se resume apenas a cervejas de abadia e trapistas e, embora muitas receitas não possuam um estilo determinado, podemos acrescentar à lista de tipos de cerveja da escola belga as seguinte:
De modo geral, a escola belga de cerveja tem um perfil sensorial muito marcado pela levedura, com maior realce ao frutado e ao malte do que ao lúpulo. E possui uma riqueza de copos únicos para cada tipo de cerveja.
Cerveja de coloração amarelo claro a ambar claro, com aroma e sabor de lúpulo praticamente ausente e amargor baixo a médio-baixo. Além disso, conta com corpo médio a baixo com aromas de malte suave seguido por notas condimentadas e ésteres frutais. Teor alcoólico de 6,3% a 7,9%.
De coloração marrom a muito escura com ótima estabilidade de espuma. Aroma de malte que remete ao caramelo, chocolate e frutas secas, com corpo baixo a médio e amargor médio-baixo a médio, podendo conter resíduo de fermentado devido a re-fermentação na garrafa. Teor alcoólico de 6,3% a 7,6%.
Coloração dourada, com caráter complexo e levemente condimentado. Notas fenólicas de cravo estão presentes e ésteres frutais em níveis baixos. É uma cerveja de amargor médio a médio-alto, de corpo baixo e aftertaste levemente adocicado, com álcool bem evidente, também pode conter resíduo de levedura proveniente da re-fermentação na garrafa. Teor alcoolico de 7,1% a 10,1%.
Coloração dourada a cobre, com aroma e sabor de lúpulo nobres suaves e amargor baixo a médio, de corpo leve a médio, com aroma de malte que remete a biscoito, com níveis baixo a moderado de ésteres frutais, podendo conter baixa concentração de aroma fenólico. O teor alcoólico varia de 4,1% a 6,3%.
Nessa receita, é comumente utilizado açúcar, podendo contar com ervas e especiarias também. Além disso, apresenta percepção de amargor em nível médio, com teor alcoólico marcante. Cerveja de corpo baixo a médio, com caráter de malte baixo a médio que complementa os ésteres frutais e notas fenólicas. Teor alcoólico varia de 7,1% a 11,2%.
De coloração âmbar médio a muito escura, normalmente utiliza açúcar e apresenta corpo médio a alto. Amargor, sabor e aroma de lúpulo são baixos a médio, com teor alcoólico marcante e com presença elevada de malte, o que confere certa cremosidade à cerveja. Apresenta também uma complexidade de ésteres frutais com notas fenólicas suaves. Teor alcoólico varia de 7,1% a 11,2%.
Cervejas claras que normalmente utilizam trigo não malteado e condimentos como casca de laranja amarga e sementes de coentro, que devem ser perceptíveis no aroma junto com notas fenólicas. São cervejas turvas, de corpo baixo a médio, de baixo amargor com leve acidez. Teor alcoólico varia de 4,8% a 5,6%.
Cerveja intensamente esterificada, ácida e, algumas vezes, com características acéticas. Apresentam, em suas receitas, trigo não malteado. Além disso, são turvas e de baixa carbonatação. São cervejas com amargor baixo, sem dulçor residual, seca e de corpo baixo. Devido à utilização de Brettanomyces, apresentam aromas caprílicos e fenólicos. Teor alcoólico de 6,3% a 8,2%.
Este estilo é um blend de lambic de safras mais novas e mais velhas e que sofrem re-fermentação na garrafa. Podem ser secas ou levemente adocicadas, com aromas frutados, acéticos, elevada acidez, feitas com trigo não malteado e podendo ser turvas. Apresentam aromas caprílicos e fenólicos devido à utilização de Brettanomyces. Teor alcoólico varia de 7,0% a 8,9%.
Nessa cerveja, são adicionadas frutas cujas características devem estar presentes tanto no aroma como no sabor. Além disso, é uma cerveja ácida que deve ser harmonizada com o dulçor da fruta. Nesse sentido, podem ser secas ou levemente adocicadas. Notas caprílicas e fenólicas devem estar presentes em níveis moderados devido à utilização de Brettanomyces. Teor alcoólico varia de 5,7% a 8,9%.
As Brown Ales são oriundas de Flanders Oriental, e as Red Ales, de Flanders Ocidental. Além disso, são produzidas através da fermentação híbrida, com uma primeira fermentação alta, seguida de fermentação e maturação que leva cerca de 2 anos em barricas de madeiras, onde crescem microorganismos como Lactobacillus, Acetobacter e Brettanomyces.
A coloração varia de cobre intenso (Red Ales) a marrom (Brown Ale). Apresenta característica láctica de moderada à intensa, podendo as Reds apresentarem acidez acética. Ésteres frutais são marcantes, lembrando cereja, e aroma e sabor de lúpulo são ausentes. Dulçor residual do malte balanceado com a acidez, podendo as Brown Ale apresentarem notas de cacau.
Nessas cervejas, notas amadeiradas são bem-vindas. No entanto, devem estar em harmonia com toda a cerveja, e aromas de Brettanomyces devem estar ausentes ou em níveis muito baixos. Teor alcoólico varia de 4,8% a 6,6%.
Cerveja da escola belga com presença marcante de malte no sabor e no aroma, que variam de notas caramelizadas e torradas dependendo do malte utilizado. Corpo e amargor baixo a médio, acompanhados por aroma e sabor de lúpulos nobres em baixa intensidade. Além disso, apresentam aromas frutados de média a alta intensidade, com notas terrosas, mofadas e de estábulo podendo estar presentes devido à Brettanomyces, quando utilizada. Teor alcoólico varia de 4,4% a 8,0%.
Cerveja de coloração dourada a âmbar claro, de corpo leve a médio. Ésteres frutais dominam o aroma e notas de malte são suaves, com aroma e sabor de lúpulos europeus (normalmente floral, herbal e/ou amadeirado) presentes de baixo a médio, e amargor médio-baixo a médio.
Nesse sentido, conta com notas condimentadas, remetendo à pimenta preta. Além disso, outras notas fenólicas são comuns, e pode-se ou não utilizar Brettanomyces. São cervejas bem atenuadas e, muitas vezes, refermentadas na garrafa. Notas terrosas, mofadas e de “celeiro” são bem vindas. Teor alcoólico varia de 4,4% a 6,8%.
Coloração varia de claro a escuro, conforme o estilo base utilizado e, muitas vezes, influenciado pela cor da fruta utilizada. Aroma e sabor de malte pode ser de imperceptível a médio-alto, com aroma e sabor de lúpulo de baixo a alto. Além disso, bactéria ácida e atributos de fermentação podem estar ausentes ou podem estar presente. Se presentes, tais atributos contribuem para acidez e também para aumentar o equilíbrio frutado. De forma geral, as características em segundo plano devem estar de acordo com o estilo base, mas a fruta deve ficar em primeiro plano.